Santo Agostinho, Pré-socráticos, Aristóteles, Epicuro, Platão, Heidegger e Kant

Santo Agostinho, Pré-socráticos, Aristóteles, Epicuro, Platão, Heidegger e  Kant

Palavras-chave: tempo, eternidade, criação, Deus.

Autor: Agostinho de Hipona (354-430).

Obra: Confissões XI -“O homem e o tempo” (pp. 209-231)

Partes do Texto

I-Parte – Tempo da eternidade e criação (Cap. 1-13, pp. 209-217);

II- Parte – Análise do tempo (Cap.14-20, pp.217-222);

III- Parte- Tempo e medida (Cap. 21-25, pp.222-225);

IV – Parte- Conclusão sobre a análise do tempo (Cap. 26-31, pp. 226-231).


Vida e obra de Agostinho

Aurélio Agostinho, em latim Aurelius Augustinus, nasceu em Tagaste, atualmente Suk Ahras, na Argélia, em 13 de novembro de 354, filho de Patrício, homem pagão e de posses, que no final da vida se converteu, e da cristã Mônica, mais tarde canonizada. Foi o primeiro filósofo a refletir sobre o sentido da história, mas tornou-se acima de tudo o arquiteto do projeto intelectual da Igreja Católica.

Agostinho estudou retórica em Cartago, onde aos 17 anos passou a viver com uma concubina, da qual teve um filho, Adeodato. Durante a juventude e o início da vida adulta, entregou-se a uma vida desregrada e promíscua.  A leitura do Hortensius, de Cícero, despertou-o para a filosofia. Aderiu, nessa época, ao maniqueísmo, doutrina do profeta persa Mani, para quem o universo é o campo de batalha entre as forças do bem e do mal, doutrina de que logo se afastou. Depois, tornou-se um cético filosófico e dedicou-se ao estudo de Platão e do neoplatonismo, na obra de Plotino. Mesclou a influência desses dois mestres em sua filosofia cristã. Em 384 começou a ensinar retórica em Milão, onde conheceu santo Ambrósio, bispo da cidade.

Segundo relata em suas “Confissões”, a conversão ao cristianismo deveu-se a um episódio envolvido em mistério. Agostinho escutou a voz de uma criança, que lhe dizia “Toma e lê”. Abriu a Bíblia ao acaso e leu as seguintes palavras do apóstolo Paulo: “Como de dia, andemos decentemente; não em orgias e bebedeiras, nem em devassidão e libertinagem, nem em rixas e ciúmes. Mas vesti-vos do senhor Jesus Cristo e não procureis satisfazer os desejos da carne” (Romanos 13,13). Em 387, foi batizado por (santo) Ambrósio, bispo de Milão. Depois do batismo, retornou à África, onde foi ordenado sacerdote, em 391, e depois bispo de Hipona (atual Bona, na Argélia), em 396.

Agostinho escreveu obra extensa, as mais importantes são De Trinitate (Da Trindade), sistematização da teologia e filosofia cristãs, divulgada de 400 a 416 em 15 volumes; De civitate Dei (Da cidade de Deus), divulgada de 413 a 426, em que são discutidas as questões do bem e do mal, da vida espiritual e material, e a teologia da história; Confessiones (Confissões), sua autobiografia, divulgada por volta de 400; e muitos trabalhos de polêmica (contra as heresias de seu tempo), de catequese e de uso didático, além dos sermões e cartas, em que interpreta minuciosamente as Sagradas Escrituras.
A obra filosófica de santo Agostinho leva em conta sua experiência pessoal e tem um caráter inegavelmente introspectivo. Agostinho distingue na personalidade humana uma trindade formada por memória, inteligência e vontade, e é compreendendo-a que se pode compreender a trindade divina.

A obra de santo Agostinho, em si mesma imensa, de extraordinária riqueza, antecipa, além disso, o cartesianismo e a filosofia da existência; funda a filosofia da história e domina todo o pensamento ocidental até o século XIII, quando dá lugar ao tomismo e à influência aristotélica. Voltando à cena com os teólogos protestantes (Lutero e, sobretudo, Calvino), hoje é um dos alicerces da teologia dialética. Santo Agostinho morreu em Hipona, em 28 de agosto de 430. Logo após sua morte ele foi reconhecido como santo. E nessa data, 28 de agosto, é festejado como doutor da igreja.

Fichamento da obra Confissões XI

I-Parte – Tempo da eternidade e criação (Cap. 1-13, pp. 209-217)

Todo o processo de entendimento da obra Confissões de santo Agostinho se dá pelo questionamento. Agostinho conversa com Deus e louva-o durante toda a obra.

Agostinho, também medita sobre os segredos da lei de Deus (Sagradas Escrituras) e pede para que Ele o conceda o dom de compreendê-los, alegando não ter nessa vontade nenhum desejo terrestre. Dessa forma declara ser indispensável o conhecimento aprofundado das Escrituras e que estas só podem ser bem interpretadas através da fé, pois apenas esta (a fé) sabe ver a revelação de verdades divinas.

Da mesma forma que concebe a natureza divina, santo Agostinho concebe a criação, idéia pouco tratada pelos gregos e característica dos cristãos. As coisas se originaram em Deus, que a partir do nada as criou pronunciando palavras eternas (o Verbo), não transitórias. Pois o que muda e se move, o que é relativo e passa ou desaparece requer o imutável e o absoluto, essência do próprio Deus, que criou as coisas segundo modelos eternos como ele mesmo. Deus não tem começo nem fim, mas as coisas por Ele criadas têm início e fim. Assim, o que o platonismo chamava de lugar do céu passa a ser, no pensamento agostiniano, a presença de Deus. Tudo o que existe no mundo foi criado ao mesmo tempo, em estado de germe e de semente.

Quando se refere ao questionamento dos maniqueus quanto à eternidade de Deus e sua possível ociosidade antes da criação, Agostinho procura diferenciar a divindade (o eterno) da criatura dizendo que a vontade de Deus não pode se comparar a uma criatura, ao variável. A vontade de Deus também é eterna. É dessa forma que ele responde as perguntas de seus opositores, sempre diferenciando o Criador da criatura.

Para Agostinho era contestável a idéia de que Deus ficara ocioso antes da criação, segundo ele, não se pode falar de um tempo que ainda não existia, pois foi Deus quem criou o tempo e Ele precedeu a todas as criações como diz o próprio teólogo e filósofo: “Criastes todos os tempos e existis antes de todos os tempos. Não é concebível um tempo em que possa dizer-se que não havia tempo”. (Agostinho [Confissões XI], 1987, p. 217).

Para santo Agostinho, o tempo não pode medir a eternidade, pois este é variável e só podem ser atribuído as criaturas: se é passado já não existe, se é futuro ainda não existe, se está decorrendo (deixando de existir) é transitório. O eterno (divino) é o presente, o que sempre é Ele não pode ser dito ou definido: é o que é em todos os tempos e em qualquer lugar (é clara nessa concepção, a influência de Platão, que santo Agostinho assume em vários pontos de sua obra).

II- Parte- Análise do tempo (Cap.14-20, pp.217-222)

Como já foi dito, para Agostinho, o tempo teve início quando o mundo começou a existir e foi com palavras eternas que Deus criou todas as coisas.

Em toda obra, Agostinho faz sua análise do tempo ressaltando seu aspecto psicológico, ou seja, a noção do antes e do depois que as coisas gravam na alma, a única realidade do tempo reside na alma, o tempo não existe no mundo exterior, é subjetivo. Portanto, não pode ser medido. O tempo não pode ser longo nem curto porque não tem extensão.

Agostinho explica o dom da adivinhação dos humanos, dizendo que estes não vêem os próprios acontecimentos, mas vêem com a alma pistas desses acontecimentos, como diz o próprio Agostinho: “De modo algum podem ser vistos se não existem. Mas podem ser prognosticados pelas coisas presentes que já existem e se deixam observar”. (Agostinho [Confissões XI], 1987, p. 221).

Agostinho faz essa conclusão da análise do tempo dividindo o tempo psicológico em: lembrança presente das coisas passadas, visão presente das coisas presentes e esperança presente das coisas futuras.

Santo Agostinho não faz uso de termos exatos, sempre supõe possibilidades, em se tratando de tempo, usa suas palavras com cuidado. Suas idéias se dão de forma gradual ao longo dos capítulos.

III- Parte-Tempo e medida (Cap. 21-25, pp.222-225)

O tempo foi criado por Deus, mas não é para Deus, pois sendo o tempo variável não pode ser atribuído a Deus. O tempo só existe para o homem. Como o tempo não é eterno, é transitório, é uma distensão da alma, não pode ser medido. Refere-se assim ao tempo psicológico como já foi falado anteriormente.

Agostinho fala também do tempo astronômico quando diz que o tempo não é o movimento dos corpos, fazendo crítica ao que o filósofo Aristóteles afirmava, dizia ele que o tempo era o movimento dos corpos. Agostinho explica que os corpos só se movem no tempo, não podemos medir quanto, a menos que saibamos quando ele começou e quando ele parou, sendo assim o movimento dos copos não é o tempo. Pois se os corpos precisam do tempo para se mover, como pode ser o movimento o próprio tempo? Pelo contrário é o tempo que mede o movimento dos corpos.

Critica também Platão quando nega que o movimento do Sol, da Lua e dos astros é o tempo, pois se assim fosse seria também o movimento de todos os corpos já negado por ele quando critica Aristóteles. Nesse contexto, cita como exemplo uma passagem bíblica em que o Sol pára a pedido de Josué, mas o tempo continua a decorrer. Querendo dizer assim que o movimento do mesmo não é o tempo. Estando narrada no texto revelado pelo próprio Deus, a história de Josué não pode ser contestada.

IV – Parte Conclusão sobre a análise do tempo (Cap. 26-31, pp. 226-231)

Agostinho diz que o tempo é no espírito expectação, atenção e memória. O futuro longo é apenas a longa expectação do futuro, o pretérito longo é a longa lembrança do passado. E é através da memória (espírito) que ele vê que é possível resgatar o passado e fazer previsão do futuro, podendo medir essas marcas em tempo presente. Ele afirma que o presente arrasta o futuro para o passado, e cria como conceitos: “presente do passado, “presente do presente”, e “presente do futuro”.

Nesses últimos capítulos, Agostinho põe fim a suas especulações e retoma agora ao questionamento exposto no início, o de seus opositores, o qual não tolera e pede a Deus que estes entendam que Deus preexiste a todas as criaturas e é o criador de todas elas e mesmo que algumas destas preexistam aos tempos (céu e a terra) não são semelhantes nem iguais a Ele. Sua preocupação agora não é nem com o passado, nem com o futuro, mas com o hoje (eterno), o que sempre é.

Segundo santo Agostinho Deus conhece de modo diferente das criaturas, nada se esconde aos seus olhos, porém Agostinho não aceita a idéia de que Ele conheça todos os segredos futuros e passados e declara o conhecimento de Deus como sendo um mistério. Deus está fora da ordem do tempo, Ele vê além do que podemos ver, observa tudo de uma só vez e não faz as coisas acontecerem tal como elas acontecem nos permite assim liberdade.

Comparações (Aristóteles, Epicuro, Pré-socráticos, Platão, Heidegger, Kant)

Santo Agostinho sendo cristão afirmava que Deus criou todas as coisas e tudo foi criado a partir do nada (ex nihilo), os filósofos naturalistas em contrapartida explicavam o princípio e o fim de todas as coisas através dos elementos (água, terra, ar, fogo), outros ainda diziam que o átomo era o princípio de todas as coisas como Leucipo, Demócrito e o filósofo antigo Epicuro e, os gregos, em geral, diziam que do nada, nada vem (ex nihilo nihil). Além disso, eram politeístas, excetuando o pré-socrático Xenófanes de Cólofon (nascido por volta de 570 a.C.) que falava da existência de um Deus único que em nada se assemelhava aos homens, concordando assim com as idéias de Agostinho, que era monoteísta. Podemos falar aqui também de Parmênides (540-470 a.C.) que também acreditava num ser uno, eterno e imóvel.

Em sua obra Confissões XI “O homem e o tempo”, Agostinho diz que se Deus precedeu a todas as criações e é o Criador de todas as coisas, não pode ter criado o céu e a terra no céu e na terra, nem no ar ou nas águas, nem a partir da matéria como alegado pelos gregos. Criou-as a partir do nada pela palavra (Verbo), uma palavra que não tem variação e é dita simultânea e eternamente.

Platão (427 – 348 a.C.) dizia que o tempo era a imagem móvel da eternidade imóvel, ou seja, o tempo é uma cópia imperfeita de um modelo perfeito (eternidade), o tempo só é real na medida em que participa do ser da eternidade, afirmou também que o tempo nasceu quando um ser divino colocou ordem e estruturou o caos primitivo. O tempo tem, portanto, de acordo com Platão, uma origem cosmológica. Como já vimos Agostinho recebeu muita influência das idéias de Platão e assim como ele acreditava que o mundo foi criado conforme o modelo eterno, ambos diziam que o tempo e as coisas foram criados simultaneamente.

Aristóteles (384 – 322 a.C.) dizia que o tempo era a medida do movimento segundo o antes e o depois. Dizer que o tempo é a medida do movimento dos corpos para Agostinho é inadmissível, pois para moverem-se os corpos precisam do tempo, dessa forma, o tempo não pode ser medido pelo movimento, principalmente de corpos celestes como o sol e a lua, e pelo contrário é o tempo que mede o movimento dos corpos.

Epicuro (342-270 a. C.) também falava sobre o tempo, mas não procurou explicá-lo detalhadamente apenas fala que a investigação acerca do tempo não pode ser conduzida às preconcepções que contemplamos em nós mesmos, devemos considerá-lo em semelhança com a evidência imediata, em outras palavras, não devemos confundir o tempo com a alma. O que é contraditado por Agostinho. Epicuro também fez crítica à religião, chegou a dizer que esta era fabulação ilusória, nascida do medo da morte e da natureza e ainda que era superstição.

Agostinho costumava dizer que razão e fé deveriam andar sempre juntas, por essa razão foi duramente criticado por Immanuel Kant (1724-1804) que dizia que a teologia na filosofia distanciava a essência da própria filosofia. Para Kant o tempo e o espaço eram as formas da sensibilidade, que era entendida por ele por faculdade de percepção. O espaço é a forma da experiência ou percepções externas; o tempo é a forma das vivências ou percepções internas.

O filósofo contemporâneo Martin Heidegger (1889-1976) apesar de ter vivido em uma época bem distante da de Agostinho, e já no nosso período histórico, afirmou em sua obra O conceito de tempo que “lidar com o tempo não é um medir” e ainda “originariamente o tempo não tem extensão”. Podemos perceber assim que o que foi dito por santo Agostinho ainda soa na contemporaneidade.

Referências Bibliográficas

AGOSTINHO, Santo bispo de Hipona. Confissões. Trad. J. Oliveira Santos et. al. São Paulo: Abril Cultural, 1987.

Vida e obra de Agostinho disponível em:

http://blog.bibliacatolica.com.br/santos-da-igreja/biografia-de-santo-agostinho/       Acesso em: 21 abr 2010;

http://educacao.uol.com.br/biografias/santo-agostinho.jhtmAgostinho. Acesso em: 21 abr 2010

Por: Roberta Caetano

2 Comentários

  1. Ezequiel said,

    22 de julho de 2010 às 19:17

    Robertaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!
    ficou massa sua pagina!!! eu naw lie tudo mas deu pra perceber que eh bem lesgal!!!
    bjussss

  2. Luiz Moura said,

    19 de agosto de 2013 às 13:58

    Parabéns, Roberta. Li o seu trabalho, em 19.08.2013, pesquisando um pouco sobre Santo Agostinho, e achei excelente. Não sei se seguiu adiante pesquisando e divulgando fatos como esses mas deveria, pois os jovens, principalmente, precisam muito desse tipo de leitura e conhecimento.


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